Monólogo 5# - Rubi Caleidoscópico I

quinta-feira, julho 03, 2008

Ela entra naquela sala refrigerada toda tímida.
Crise de pânico com desconhecidos. Sempre ocorria em lugares novos.
Sentou lentamente, fazendo o mínimo de barulho possível, abriu o livro antigo e recomeçou a ler.
Logo se dera conta que a aula começara; recebera o material, fizera os exercícios tranqüilamente.
Passados 30 minutos, a porta se abre lentamente. Ele entra, se desculpa discretamente ao professor, pega o material e mapeia a sala com os olhos atrás de um lugar para poder se sentar. E encontra.
Ela sente a pressão dos pés dele atrás da sua carteira, e o aroma suave da colônia na qual ele usava. Pôde fechar os olhos por um instante e sentir os ruídos leves da escrita violenta dele entre números e letras. Então é acordada de seu sonho ao ouvir papéis e lápis caírem pelo chão.

Ela se assusta e procura a fonte do barulho. Olha para baixo, atrás de si. Ele tentava capturar, sem sorte, os lápis e canetas, enquanto vigiava os papéis para evitar um vôo destes. Então uma mão suave os pegou e organizou caprichosamente. Ele a observou atônito e desconcertado, com as canetas querendo cair da sua mão novamente. Ela chamou-lhe a atenção em relação a isso, e ele então segurou com mais força os objetos.
Entregou-lhe os papéis e lhe murmurou um acanhado 'obrigado' á ela, meio vermelho por trás dos óculos. Abriu um grande sorriso, e um segundo antes que ela virasse para frente novamente, podia jurar que havia sido retribuído.
Ela ficou com o agradecimento dele ecoando em seus pensamentos, mas resolveu voltar á apostila, descendo os olhos. No intervalo, ele nem se mexeu do lugar. E quando ela levantou para beber um pouco de água, ele levantou os olhos para observá-la sair da sala sem olhá-lo.
Voltando a sala, se deu conta que ele era um mistério, que fazia seu coração brincar numa gangorra, do cérebro ao estômago, revirando-lhe tudo ao cruzar um olhar sequer com o garoto. Ela se sentou e voltou ao livro do início da aula. Encostou-se mais confortavelmente, se inclinando um pouco pra trás, quando sua costa roçou levemente nos cabelos dele.
Ele não se moveu para reclamar, tampouco fez qualquer barulho. Então ela continuou ali, sentindo um pouco do calor que ele emitia.

Ao fim da aula, ela começou sua rotina caminhada de três quarteirões até a parada de ônibus. Ao olhar para trás, procurando-o entre tantos alunos, o viu se dirigindo a mesma direção que ela. E ficaram assim, com aquele medo vulgar de se olharem e terem seus sentimentos reconhecidos um pelo outro, mas sempre caminhando particularmente perto um do outro.
Ao atingirem a parada dela, ela ficou e ele seguiu o caminho, trocando um último olhar de desespero e de angústia de se separarem.
Ela esperou o ônibus por vários minutos, e subiu ainda com o pensamento no menino que se separara dela há minutos. Sentada, passado algumas ruas, ela o viu. Ele caminhava ao sol, já a um bocado de quadras da parada dela. A blusa vermelha dele parecia chamá-la.
E ela nem imaginava que naquele exato momento, ele pensava como iria perguntar o nome da garota dos sapatos vermelhos na próxima aula.
E sem saber, ao mesmo tempo, ambos sentiram uma vontade enorme de que chegasse o amanhã.


(Fernanda Pina)


Dedicatória:
Ao colega do cursinho que ainda não sei o nome, depois de três aulas e conversas :)

Obs: História não verídica; só os personagens foram baseados.

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