A violência escancarada (e ninguém faz nada sobre isso).

sexta-feira, março 29, 2013

Há duas semanas eu estava em casa quando recebi uma mensagem de uma amiga pedindo para que eu fosse no apartamento dela. Inicialmente, achei um pouco estranho porque não somos muito próximas, mas fui até lá. Entrei e ela parecia um pouco abatida, perguntei o porquê e ela pediu para que eu sentasse. Ela sentou na minha frente e desabou. Quando falo em desabou, é que na verdade ela começou a chorar copiosamente e me abraçou. Tentei acalmá-la, mas foi inútil. Então ouvi o que ela estava tentando me dizer... "não sei o que fazer, Fer".
"Como assim? O que houve?"
Ela suspirou, segurou o choro e começou.
"Eu tinha nove anos, ele era bem mais velho, adulto já. Ele falava que era brincadeira, mas não era, Fer. Ele me ameaçava, dizia que ia contar tudo pra minha vó das coisas sujas que eu tava fazendo. Ele era amigo da família, todo mundo confiava nele, ninguém desconfiou de tudo que ele fez comigo".
Eu não soube como responder, só abracei ela de novo. Falei para ela se acalmar, falei da necessidade d'ela procurar por ajuda, quem sabe conversar com a família dela. Ela balançou a cabeça, indicando que não queria. Imagino que é complicado demais, se é difícil para ela falar para mim, imagine contar para os pais, os irmãos,...
"Fer, não foi só essa vez. Quando eu tinha doze anos, um dos meus primos cansou de entrar no meu quarto dizendo que eu tinha corpo de mulher, que aquilo era normal entre primos, que era amor de primos. Ele é quatro anos mais velho. Nunca tive certeza, mas acho que perdi a virgindade nessa época".
Nesse ponto eu já estava chocada o suficiente que não conseguia abrir a boca, porém não tinha acabado.
"Eu levei um tapa, Fer! Eu tava saindo de uma festa em uma república com mais uma amiga, daí um grupo de garotos chegou perto da gente. Um deles puxou meu braço pedindo pra que eu beijasse ele. Eu neguei e ele virou um tapa em mim. Os outros que estavam com ele só riram e eu saí chorando com as minhas amigas".
"Você tem que denunciar ele, cara!" Falei já indignada com tudo aquilo. "Denunciar ele e outros, procurar ajuda psicológica. Você talvez ache que não tenha traumas, mas você provavelmente não vai saber identificar isso. Fora as lembranças ruins que vão estar aí contigo".
"Não tenho coragem. Como as pessoas vão olhar pra mim? Tenho medo do que vão falar, de como minha família vai encarar. Fora que todo mundo vai dizer que eu tô me fazendo de vítima, que eu quis, que eu sou a culpada, e vai que eu realmente sou, que eu deixei..."
Nesse ponto eu já não poderia deixar ela continuar a falar.
"Primeiro: você não é a culpada! Onde raios você achou isso? Segundo: você é a vítima. Esses caras usaram da inocência de uma criança, e de força nesse último caso! Você precisa denunciar, procurar ajuda. Ter força e não se martirizar é o primeiro passo. Você precisa falar sobre isso, tem tanta gente que passa por isso, principalmente abuso na infância. As pessoas acham que isso é normal, que passa, que a vítima esquece! Não é assim!"
"Fer, você publica isso pra mim, no seu blog?"
"Mas ele nem é conhecido..."
"Publica?"

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